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Buda Pop - Parte 3


"Cresci conhecendo muito pouco o que se passava no mundo, e foi nessas condições que, aos 16 anos, tive que liderar meu país contra a invasão da China comunista", compartilha do Dalai Lama. 

(O sacerdócio de um Lama é rigoroso, mas não triste)

Educado sob disciplina rigorosa, Tenzin Gyatso afirma que "não foi uma infância infeliz", e é grato à benevolência de seus professores, que lhe proporcionaram todo seu conhecimento religioso e "fizeram o possível para satisfazer uma curiosidade saudável por outros assuntos". 

(O Dalai Lama e o Presidente Bush, num encontro para pedir perdão ao Iraque)

Frente à China comunista, Dalai Lama optou pela não violência e a propaga até hoje. 

(Dalai Lama e o Presidente Obama e a necessidade de negociar a igualdade
entre os homens) 

"Os princípios de compaixão e não-violência do Dalai Lama dão forma à sua visão global", explica o professor Victor Chan, que conviveu com Sua Santidade para escrever o livro A Sabedoria do Perdão. 

(A ditadura da China sobre o Tibete, algo que ainda é real e insolúvel)

Em decorrência da China ter invadido o Tibete com 80 mil homens - contra 8.500 do exército local - aproximadamente 1,2 milhão de tibetanos (de uma população de 6 milhões) morreram e 6.400 mosteiros (99,9% do total) foram destruídos. 

(Exército Chinês em exercício no Tibete)

Mesmo assim, o Dalai Lama não gosta de propagar a violência infligida pelos chineses. Considera os inimigos professores valiosos que podem provocar o desafio necessário para cultivar qualidades como compaixão e perdão. 

(Liberdade ao Tibete, já!)

"Sou otimista. A China está mudando. E o que eu peço não é a separação da China, mas uma aproximação pelo caminho do meio: manter o vínculo econômico com a República Popular da China, ao mesmo tempo em que o Tibete possua autonomia completa e governo próprio."


A Serviço da Compaixão

Uma gargalhada gostosa é sua marca registrada.

(O espírito brincalhão do Iluminado)

E o espírito brincalhão é uma característica que o Dalai Lama justifica ser proveniente do jeito de ser do povo tibetano.

(Dalai Lama em seu momento de oração)

Ao longo do último meio século, não há um dia sequer em que ele deixe de meditar sobre a compaixão. 


"Descobri que o mais alto grau de paz interior decorre da prática do amor e da compaixão. Quanto mais nos importamos com a felicidade de nossos semelhantes, maior o nosso próprio bem-estar. Essa é a principal fonte da felicidade."

Ele acredita ser o primeiro beneficiado ao lutar pela felicidade dos outros. 

Quando não está viajando, seu dia começa às 3h30. Meditações e preces são feitas até o horário do almoço. A cozinha em Dharamsala é vegetariana, mas o Dalai Lama nem sempre segue a dieta. 

A parte da tarde é reservada para audiências e entrevistas. 

(Dalai Lama em Dharamsala)

Um chá é servido às 18h, com direito a alguns biscoitos. Até as 20h30, quando se recolhe para dormir, faz suas orações da noite. Essa é a rotina que fornece a base para seus três compromissos em vida. 

Primeiro, ele se dedica a promover valores como compaixão, perdão, tolerância, contentamento e autodisciplina para todos os seres. Para ele, esses são os valores de uma ética para o novo milênio. 

(Dalai Lama e o Arcebispo Anglicano Desmond Tutu, porque a paz entre as religiões é mais importante que a fé pessoal)

Depois, sua preocupação é com a integridade de todas as maiores tradições religiosas, acreditando que, apesar das diferenças, todas elas têm potencial para promover o bem-estar dos seres humanos. 

Por fim, seu terceiro compromisso, com o povo tibetano, é o único que poderá acabar, caso uma solução mutuamente boa para o Tibete e a China seja alcançada. E tudo isso sempre com seu indefectível sorriso estampado no rosto. 


Fim.:.



Referências Bibliográficas

Livros

A Arte da Felicidade: Um Manual para a Vida, de Sua Santidade, o Dalai Lama e Howard C. Cutler, ed. Martins Fontes, 2006.

A Sabedoria do Perdão: Conversas Íntimas e Jornadas, de Sua Santidade, o Dalai Lama e Victor Chan, ed. Martins Fontes, 2006. 

Dalai Lama, Meu Filho: A História de uma Mãe, de Diki Tsering, ed. Ediouro.

Imagine All The Peaple: Uma Conversa com o Dalai Lama sobre Temas Polêmicos e Atuais, de Dalai Lama e Fabien Ouaki, ed. Versus, 2005.

Minha Terra e Meu Povo: A Autobiografdia de Sua Santidade, o Dalai Lama, de Dalai Lama, ed. Sextante, 2006.

Uma Ética para o Novo Milênio, de Sua Santidade, o Dalai Lama, ed. Sextante, 2006.

Filmes 

Kundun, dir. Martin Scorcese, distr. Touchstone Pictures, 1997.

(Cenas do filme Kudun)
Sete Anos no Tibete, dir. Jean Jacques Annaud, distr. desconhecido, 1997.
(Cenas do filme 7 Anos no Tibete

Buda Pop - Parte 2

(Tenzin Gyatzo, o Dalai Lama com 4 anos)

Aos 4 anos, foi transferido com a família para Lhasa. 

(O pequeno monge Gyatso no Palácio de Potala)

No Palácio de Potala foi iniciado como monge e assumiu o extenso nome de Jamphei Ngawang Lobsang Yeshe Tenzin Gyatso.

Segundo o budismo tibetano, o primeiro Dalai Lama, nascido no ano de 1931 da era cristã, era a encarnação de Chenresi, o Buda da Compaixão.

(Buda Chenresi, o Buda da Compaixão)

Cada Dalai Lama é a reencarnação de se antecessor e a ele cabe o governo espiritual e temporal do Tibete.

(Governo tibetano chamado de Gaden-Phodrang)

Na forma atual de governo chamada Gaden-Phodrang, Dalai Lamas se sucederam na liderança e, durante sua ausência ou menoridade, o Tibete é conduzido por regentes monges e leigos.

A partir daí, Tenzin Gyatso usaria roupas de monge, cabelo raspado, se comprometria ao celibato e estaria proibido de comer à noite, entre outrs restrições comuns a todos os monges - apesar de confessar que se dá o direito a alguns biscoitos depois do pôr do sol, quando a fome é grande.

Sua educação incluiu lógica, arte e cultura tibetana, sânscrito, medicina e filosofia budista. 

(O estudante)

Além das disciplinas curriculares, procurava conhecer mais sobre o mundo e foi daquelas crianças que adoram desmontar brinquedos, sempre um fascinado por objetos mecânicos. 

Ganhou um projetor de cinema a manivela e ao desmontá-lo descobriu as baterias que alimentavam sua luz elétrica: "Foi o meu primeiro contato com a eletricidade e sozinho descobri como fazê-lo funcionar novamente".

Luta Pela Paz

Em 1950, a China comunista decidiu tomar do Tibete a independência obtida em 1912 para fazê-lo retornar aos domínios da República Popular da china. 

(O jovem Dalai Lama)

Tal fato fez com que fosse empossado Dalai Lama antes de sua maioridade, aos 16 anos. Seu primeiro ato foi declarar anistia a todos os presos.

"Ser Dalai Lama é um cargo instituído pelos homens. Eu me considero apenas um simples monge".

(Mao Tse Tung e a ditadura sobre a China e Tibete)

Aos 24 anos, prestou com louvor os exames conclusivos de sua educação monástica - pouco antes de ser obrigado a se disfarçar de soldado chinês para fugir com duas mudas de roupas de monge na bagagem para a Índia, em 1959.

(Dalai Lama em Dharamsala num templo budista)

Desde então, há 46 anos, o simples monge líder do povo tibetano vive exilado em Dharamsala, cidade ao norte da Índia. 

"Eu tento tratar qualquer pessoa que conheço como um velho amigo. Isso me traz uma experiência de genuína felicidade. É a prática da compaixão."


Continua...

 

Buda Pop - Parte 1


"É como um astro do Rock" - Essa é a resposta imediata que o Dalai Lama dá ao escritor Victor Chan quando questionado porque algumas pessoas, ao vê-lo, se emocionam ao ponto de chorar. 

"Quando eles (astros do rock) aparecem, algumas pessoas pulam e choram. Semelhante..." - compara o Dalai Lama, agitando os braços como se fosse um tiete. 


Respostas pop como essa fizeram dele um ídolo acessível para multidões. Como boas letras de música, suas ideias são facilmente compreensíveis para adeptos de qualquer credo ou mesmo de nenhum: 

"Todos os seres vivos são iguais. Todos querem felicidade e não querem sofrer."


O nome já diz a que veio: Dalai Lama significa "Oceano de Sabedoria" - o que é perceptível já em seu semblante, sempre inspirador e risonho. 

Um Lama Encarnado

Dessa forma, o líder espiritual vem cumprindo sua meta - não a de trazer adeptos ao budismo, mas a de tornar a Terra um lugar mais fácil de viver. 

Rezar, para ele, não basta. O que o 14º Dalai Lama diz é que é preciso engajamento e determinação para qualquer transformação social e espiritual. 


"Antes de mais nada, temos que aprender como as emoções e comportamentos negativos nos são prejudiciais - para a sociedade e para o futuro também - e como as emoções positivas são benéficas", diz ele. 

(Lhamo Thondup, o Dalai Lama, com 2 anos de idade)

Dalai Lama nasceu Lhamo Thondup em 1935 no vilarejo de Takster, próximo à fronteira da China com o Tibete. 

(Pai, mãe e o irmão mais velho de Lhamo)

Seu pai, "um homem cuja extrema bondade convivia com um temperamento irascível", era um camponês apaixonado por cavalos. 

Durante os meses de sua gestação, ele permaneceu gravemente enfermo até a manhã em que seu filho nasceu, quando acordou sentindo-se perfeitamente curado. 

Foi também a partir desse nascimento auspicioso que um período de quatro anos de colheitas desastrosas em Takster chegou ao fim. 

(Vilarejo de Takster no Tibet)

Esses dois fatos são considerados sinais, segundo superstições tibetanas, de que haveria o renascimento de um graduado lama (um sacerdote budista) encarnado. 

Sua descoberta não se deu por acaso. Depois da morte do 13º Dalai Lama, em 1933, iniciaram-se as buscas pela sua reencarnação, algo comum na tradição budista.

Num lago sagrado próximo a Lhasa, um regente, indicado pela Assembleia Nacional para governar o Tibete até que a reencarnação atingisse a maturidade, teve visões que apontavam para Takster.

(Lama Kewtsang Rinpoche)

Uma missão foi enviada para o vilarejo, entre eles o lama Kewtsang Rinpoche, do mosteiro de Sera, que chegou à casa de Lhamo Thondup disfarçado de criado. Ele foi prontamente reconhecido por Lhamo Thondup, então uma criança de 2 anos. 

(Dalai lama sendo instruído pelos lamas de Sera)

"Sera-aga", disse ele para o criado: "Você é um lama de Sera".

Lhamo também reconheceu o mala (rosário tibetano) que o criado disfarçado trazia no pescoço: "É meu", disse, apontando para o mala que havia pertencido ao 13º Dalai Lama. 

(Rosário tibetano)

É comum, segundo o budismo, crianças reencarnadas lembrarem-se de objetos e pessoas de suas vidas passadas, e esses foram só alguns dos sinais que fizeram Lhamo Thondup ser reconhecido como o 14º Dalai Lama.

Continua...



Colecionador de Histórias - Parte 2

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O Melhor Amigo do Leitor

Hoje as coisas mudaram um pouquinho em casa. Mindlin começou a sentir a perda da visão e passou a contar com a ajuda de suas bibliotecárias, ou, como diz, suas “três graças”: Rosana Gonçalves, Cristina Antunes e Elisa Nazarian.

(José Saramago e Mindlin)

São elas as responsáveis pela organização dos livros e do acervo do casal. E lhe fazem a leitura em voz alta dos livros. O da vez é o romance As Intermitências da Morte, do português José Saramago, amigo de Mindlin.

Os livros foram os responsáveis por várias de suas amizades. Tornou-se amigo, por exemplo, do poeta Carlos Drummond de Andrade (1902-1987).


Passeando pela biblioteca, Mindlin aponta uma prateleira mais baixa. “Aqui é Drummond”, diz, retirando um exemplar de Corpo. Abre a primeira página e lá está:

Procuro no dicionário, falta rima para o corpo. Não é nada extraordinário. Sua rima é outro corpo.

"Ao querido amigo José Mindlin, um abraço afetuoso, do Drummond”.

(João Guimarães Rosa, autor de Grande Sertão: Veredas)

Foi ainda amigo de João Guimarães Rosa (1908-1967), de quem guarda, com todo cuidado e orgulho que possa existir neste mundo, o original de Grande Sertão: Veredas, um calhamaço datilografado e corrigido a mão.

(Mindlin com a versão original de Grande Sertão: Veredas)

Outra preciosidade: um original de Graciliano Ramos (1892-1953). “Ele revisava apenas as provas”, diz Mindlin, mostrando a primeira delas de um certo livro de nome estranho: O Mundo Coberto de Pennas.

(Original de Vidas Secas, manuscrito pertencente ao acervo de Mindlin)

O título, no entanto, está riscado, corrigido num golpe certeiro de caneta preta. Abaixo dele está rabiscada a correção: Vidas Secas, publicado pela primeira vez em 1938 e hoje um clássico da literatura brasileira.

Os exemplos citados seriam o ápice da paixão de Mindlin, que começa quando lê os livros em edições comuns. Depois, procura por outras obras do mesmo autor, até ler sua obra completa.


Aí, então, muitas vezes em conversas, percebe que existem outras edições, do mesmo autor, porém mais bem impressas, às vezes fartamente ilustradas.

O gosto pelo conteúdo se combina, assim, ao gosto pelo corpo do livro: sua beleza, sua raridade, elementos que reforçam o desejo de conhecimento”, definiu o crítico Antonio Candido, confrade de Mindlin, no prefácio de Não Faço nada sem Alegria – A Biblioteca Indisciplinada de Guita e José Mindlin.


Erguida graças à paixão, a coleção de Mindlin ganhou proporções não apenas gigantes, mas ainda bem valiosas. Dentre elas,o mais antigo livro data de antes da chegada dos europeus a estas terras. Trata-se da primeira edição ilustrada dos Sonetos, de Petrarca, impressa em 1488.

(Sonetos, de Petrarca, impressa em 1488)

Há ainda um manuscrito com orações datado do século 15. E a primeiríssima edição dos Lusíadas (1572), de Camões.

(Edição dos Lusíadas de 1572)

Algumas das obras raras foram adquiridas em sagas que mostram como a vida de José Mindlin se mistura à da sua biblioteca. Como a vez em que se meteu a vender publicações raras, na livraria que montou no centro de São Paulo, A Pathernon.

(Site em homengem à Mindlin onde a Pathernon é digital)

Na década de 1940, ele e um amigo receberam um investimento para montar o negócio. Seguiram então para uma Europa devastada em busca de livros. O problema, conta Mindlin, era o momento em que chegavam os compradores.“Eu dizia para eles que se um dia quisessem vender os livros, que falasse, comigo”. Foi assim que a primeira edição completa dos ensaios, de Montaigne (1588), voltou a suas mãos.

Como nem só de livros vive o homem, Mindlin tornou-se empresário.

(Logo de uma das empresas mais antigas do Brasil)

Em 1949 ele fundou, com alguns amigos, a Metal Leve, uma potência na fabricação de autopeças. Para ele, o que importa foi o papel social que sua empresa conseguiu exercer: “Ela tinha obrigações culturais que não poderiam ser ignoradas”, diz.

Foi assim que a empresa começou a patrocinar edições fac-símiles de documentos sobre a história da literatura brasileira. Na companhia de sua filha Diana, Mindlin cuidou especialmente do aspecto gráfico das obras, com a intenção de manter as reproduções bem próximas das originais.

(Uma iniciativa brasileira em liberar gratuitamente a literatura, história e oportunidades de aprendizado aos internautas. Aqui, Mindlin usou sua influência para ceder títulos ao público)

Ressurgiram publicações como A Revista, originalmente editada por Carlos Drummond de Andrade, e a Revista de Antropogafia, um dos mais importantes documentos da história do modernismo brasileiro.

Loucura Mansa

Dono de uma alegria que sempre levou vida afora e de um humor implacável, “graças a Deus, eu sou ateu”, José Mindlin agora se prepara para ver sair do seu quintal sua árvore mais frondosa, a biblioteca.

(Última morada dos amados livros do maior bibliófilo brasileiro)

Numa decisão da família, a parte dedicada ao Brasil da coleção (mais da metade dos livros) foi doada à Universidade de São Paulo (USP), num projeto acalentado há pelo menos 20 anos.“O valor da biblioteca existe justamente por constituir um conjunto que dificilmente se formaria novamente”, diz Plínio Martins Filho, da Editora Universidade de São Paulo (Edusp).

A ideia é que a biblioteca não se pulverize, não se espalhe e que, ao menos num período de 100 anos, não seja privatizada”, explica Sérgio, filho de Mindlin.

(Sérgio Mindlin)

Foram necessários 3 anos para que a USP construísse o prédio que abrigaria o acervo. “A gente passa e os livros ficam. Para serem conservados e mais utilizados, uma biblioteca precisa ter uma dimensão institucional”, diz Mindlin.

Que pensa no tempo de que ainda dispõe para o convívio íntimo com seus livros: “Porque quando eles saírem será meio traumático, tenho que assumir”, admite, com uma pontinha de angústia.

Mindlin chegou, inclusive, a fazer um cálculo de quanto tempo precisaria para ler todos os seus títulos: 300 anos. “Mas não consegui achar a fórmula para viver tanto. Então resolvi me contentar com o tempo de que eu disponho, que eu não se qual é, mas que, enquanto durar, eu vou aproveitando”, diz, sorrindo.

É esta, enfim, sua loucura mansa.“Uma certa obsessão em ler e reunir livros. Um pouco patológica, mas é mansa porque não faz mal a ninguém e me faz sentir bem”.

Mas nosso querido Mindlin, não é eterno e também se foi em 28 de fevereiro de 2010, mas nunca esqueceremos o esforço maravilhoso deste brasileiro que decidiu perpetuar a literatura e o amor pelos livros. Sua lição não será esquecida, amigo dos livros...!


Referências Bibliográficas

Não faço Nada sem Alegria – A Biblioteca Indisciplinada de Guita e José Mindlin, São Paulo, Museu Lasar Sagal/José Mindlin, Editor, de Tereza Kikuchi (org.), São Paulo, Edusp.

Uma Vida entre Livros – Reencontros com o Tempo, de José Mindlin, São Paulo, Edusp/Companhia das Letras.

Memórias Esparsas de uma Biblioteca – Entrevista a Cleber Teixeira e Dorothée de Bruchard, São Paulo, Escritório do Livro e Imprensa Oficial.


FIM.:.

Colecionador de Histórias - Parte 1

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A vida de José Mindlin, o empresário que ergueu com amor e humor a maior biblioteca particular do país.

A rua Princesa Isabel, no bairro do Brooklin, em São Paulo, não era nem calçada quando o casal Guita e José Mindlin se mudou para lá, já perfaziam 57 anos.

(Quintal de Mindlin, brincando com seus netos)

Ali, no quintal da nova casa, os dois encontraram um pé de jabuticaba. À sua volta, o casal plantou seu jardim: jarmins, orquídeas e outras plantas encheram de vida, a casa em todos esses anos.

Em 1985, uma parte desse jardim, bem próximo à jabuticabeira, cedeu lugar a um pavilhão feito de tijolo, cimento e pedras.

(Antiga biblioteca na casa de José Mindlin)

E dentro dele uma outra árvore, cuja semente já tinha sido plantada muitos anos antes, floresceu: a maior biblioteca particular do Brasil, composta de ao menos 38 mil títulos, boa parte deles em edições tão raras que algumas chegam a ser mais antigas que o Brasil.


A biblioteca de José Mindlin resulta de seu amor pela leitura, que despertou nele a busca pelos livros (e pelos livros que faltavam dos livros), as sagas por obtê-los, o prazer de olhá-los, manuseá-lo, suscitando assim – e sempre – um conjunto de emoções especiais que resultou numa paixão incansável por publicações.

(José Mindlin e sua "loucura mansa")

A ponto dele mesmo, o maior bibliófilo brasileiro, resumir como sendo “uma loucura mansa”.

Árvore das Letras

José Mindlin nasceu em São Paulo.

Foi o terceiro entre os quatro filhos de um casal de russos que imigraram para o Brasil no final do século 19.

(Mindlin aos 10 anos)

Mas se falava português na minha casa”, conta ele.

Tinha 13 anos quando, em 1927, já fuçava livrarias e sebos e comprava seus primeiros livros.

(A rua dos sebos em São Paulo, já andei muito por ali também... Bons tempos...! Estes ficam ao lado da Catedral da Sé)

Entre eles, um que contava a história do Brasil e que estava recheado de indicações bibliográficas. Que Mindlin seguiu, pois, queria saber mais. Escreveu para várias livrarias, perguntando pelas obras citadas que já eram, na época, bem raras.

(Livraria Francisco Alves, que após tantas mudanças econômicas ainda continua de portas abertas. Viva!)

Recebeu apenas uma resposta. Veio da Livraria Francisco Alves, no Rio de Janeiro que lhe ofereceu uma edição chamada História do Brasil, publicada em seis volumes, em 1862.

(Livros comercializados pela Livraria Francisco Alves, que com o tempo, se especializou em títulos raros)

Meus pais me deram de presente. Aí, sim, foi o começo da história", escreveu Mindlin em seu livrinho Memórias Esparsas de uma Biblioteca.

Na época, claro, Mindlin não planejava a biblioteca.

Fui me interessando cada vez mais por leitura, descobrindo autores, e daí em diante foi ladeira abaixo.”

Ladeira abaixo em busca de livros e livros que atendessem à necessidade de um leitor compulsivo, “meio indisciplinado”, costumava dizer, pelo fato de nunca ter se dedicado a um ou outro assunto exclusivamente.

Amante de literatura estrangeira e brasileira e mais de tudo aquilo que se relaciona ao Brasil (história, artes, ciências, literatura de viagens), Mindlin diz ter sido picado por uma mosca, responsável pela transmissão do vírus da leitura.

Que só me faz bem, e é incurável”, conta ele.

(Antigo exemplar do Estadão, este é de alguns dias antes de meu irmão mais velho nascer, meu pai colecionava o jornal, pois era um tipógrafo)

Chegou a trabalhar como redator do jornal O Estado de S.Paulo com 16 anos. Mas se bandeou para a advocacia. Passou boa parte das suas aulas da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco – USP, lendo sem parar.

(O sempi eterno prédio de Direito da USP, onde Mindlin e sua esposa estudaram)

Ali conheceu a moça de nome Guita Kauffmann.


(Guita e José Mindlin compartilhando mais uma paixão juntos: os livros)

Quando a viu pela primeira vez, ela estava cercada por moços que tentavam convencê-la a se inscrever em algum partido estudantil.

(José Mindlin e Guita)

Olhei para aquela confusão, ela no meio. Então me aproximei e disse-lhe que tudo aquilo era bobagem, que o bom partido dali era eu...!”, conta Mindlin.

Os dois se casaram em seguida e tiveram quatro filhos: Betty, Diana, Sérgio e Sônia.

Deles vieram os 10 netos – e mais 7 bisnetos. Todos crescendo à sombra da imensa biblioteca.

(Mindlin e sua bisneta Joaquina)

Guita e José Mindlin estão juntos há pelo menos 67 anos. Isso sim é o que ele define como legítima “fidelidade partidária”.

Em Guita Mindlin encontrou uma parceria na vida, em suas andanças em busca dos livros.“Nunca precisei esconder um livro no jardim antes de chegar em casa”, diz. Como fazia, lembra, o historiador Sérgio Buarque de Holanda, que os escondia na cozinha, antes de entrar em casa, para que Maria Amélia, sua esposa, não os notasse.

(José Mindlin lendo poesias para Guita)

Não que ela não gostasse dos livros. Mas há de levar em consideração que este é um vício que pode colocar em risco o orçamento familiar”, diz Mindlin.

(Guita restaurando os livros da biblioteca)

Há muita cumplicidade entre os dois. Se Mindlin mergulhou fundo na procura de obras raras, Guita especializou-se em restauração de livros.Outro exemplo: ele adora ler poesias em voz alta, enquanto o que ela gosta é de sentar-se para ouvir poesias.


Continua...

Aranel Ithil Dior